segunda-feira, setembro 03, 2007

Honra, a quem merece honra.

No dia 31 de agosto de 2007 o mundo ficou menos divertido.
Partiu para os braços do Pai minha querida Tia Judith.
Serva de Deus, em primeiro lugar, e mãe de uma das pessoas mais presentes em minha vida, especialmente na infância, a minha madrinha.
(Sim, tenho uma madrinha, de batismo mesmo, aquele da Igreja Católica. Meu pai ainda não havia se convertido ao protestantismo quando nasci.)

Mas Tia Judith era dona de um senso de humor muito peculiar.
Não havia "tempo ruim" prá ela.
Exceto agora, bem no finalzinho de sua vida, já com a lucidez prejudicada no alto de seus 89 anos, e pela limitação a uma cadeira de rodas (culpa de um tombo onde fraturou o fêmur D, se não me engano, que lhe rendeu uma cirurgia complicada e de recuperação dolorosa), não me lembro de ouvir reclamação dela por coisa alguma.
Tudo era motivo de piada. Nada, nada mesmo lhe passava despercebido.
Tudo era motivo prá dar uma boa gargalhada. E QUE gargalhada! Era impossível não rir junto.
Muitas vezes ela chorava de rir e nem sabia o porquê.
Se tinha dinheiro, tava bom.
Se não tinha, tava bom do mesmo jeito, pois dizia: "Deus proverá, minha filha!".
Se acordava sem "aquela dor nas juntas", tudo bem. Se acordava, dizia mais ou menos assim:
"É, ficar velha é uma M..., minha filha!". E logo vinha a larga gargalhada.
Topava qualquer parada, qualquer passeio, qualquer aventura.

Enfrentou a decepção de ver a filha (que com muito sacrifício dela se formou na faculdade) abandonar um excelente emprego e futuro promissor em uma grande empresa, para "casar" com uma pessoa que ela "sabia que a faria sofrer". E como fez...
Mas mesmo assim a apoiou e suportou em todos os momentos.
E não havia, no mundo inteirinho, filha mais linda, talentosa e maravilhosa como a dela!!!

Enfrentou com intrepidez a doença e morte do marido tão querido, que dela "foi levado tão cedo". Com a ida dele, teve que vender o Fusquinha Azul, parceiro de tantas "aventuras" com o Zezinho, seu companheiro por quase 40 anos. E como foi duro prá mim ver aquela garagem vazia, sem o fusquinha que eu sonhava dirigir quando fizesse 18 anos...
(Acho que é por isso que sou tão apaixonada, até hoje, pelos fuscas.)
Mas ela disse: "Ele vai alegrar a vida de outra falmília!" E tal qual a um filho, disse à ele para que se "comportasse bem, não quebrasse nunca, e não bebesse muito óleo!". Rs.
E até no dia do enterro do Tio Zezinho ela fez graça.
Como ele era presbiteriano, ela disse: "Ai meu Deus, será que ele foi pro céu?"
Afinal de contas, os batistas sempre implicaram com os "primos" presbiterianos por causa da diferente doutrina. E COMO ela era batista! Rs.

Amava a Igreja Batista do Tauá, na Ilha do Governador/RJ, que ajudou a fundar e construir, literalmente.
Me lembro bem da dedicação ao Coral Gláucia Leite, que tinha uma beca pesada e quente, na cor vinho. E a beca também foi motivo de piada muitas vezes, claro!
Ela tinha uma voz gostosa e melodiosa, assim como minha avó e todas as outras irmãs, e gostava de ensinar aos sobrinhos-netos suas "versões" para muitas músicas do cancioneiro da música popular brasileira.
E como eram divertidas essas versões! Lembro de apenas uma, que jamais esqueci.
A letra dela está no final de todas essas palavras. Minha avó, mais recatada e rígida, brigou muito com ela por causa dessas músicas "horrorosas"...

Se ela ligava prás "críticas" às suas obras? Imagina!
Aí é que ela cantava muitas e muitas vezes mais! Prá todo mundo ouvir!
Mas não se assuste!
Como eu disse, ela era uma pessoa que tinha um senso de humor MUITO peculiar!!! Rs.

Com certeza eu "herdei" muitas coisas dela. Não sei se pelo DNA, mas pela convivência com certeza!
Aprendi muitas das minhas caretas com ela.
Foi ela quem me ensinou todas as piadas que aprendi na infância.
Muitas de minhas travessuras ela acobertou (e tinha que ter um dom especial para isso!).
Aprendi que para o café ficar bom, é preciso por pelo menos 4 colheres de pó no coador.
Ela colocava sempre 2, e o café ficava mais para "chafé"!
Aprendi que se a porta do forno for aberta mais de uma vez enquanto o bolo está assando, há quase que 100% de chance dele "solar".
Mas ainda assim, aqueles chafés com bolos solados eram uma delícia! Que saudade...

Não pude ir ao sepultamento, por causa dos compromissos profissionais, e pelos 500 km de distância.
Mas não fiquei triste com isso. Engraçado...
Percebi que a alegria que ela deixou plantada no meu coração foi consolo suficiente.
Não tinha derramado sequer uma lágrima, até agora, enquanto escrevo essas tantas linhas.

Sei que descansou daquele corpo frágil e limitado de cerca de 38 kg.
Sei aonde ela está.
Cantando no coro celestial, com certeza!
E nos intervalos dos cânticos, deve estar contando alguma piada aos anjos e santos, deixando o céu mais divertido!


A música:

Luar do Sertão, de Catulo da Paixão Cearense e João Pernambucano (1914)

(2ª parte da canção)
Não há, ó gente, oh! Não, luar como esse do sertão Não há, ó gente, oh! Não, luar como esse do sertão

Quando vermelha no sertão desponta a lua Dentro da alma flutua, também rubra nasce a dor E a lua sobe e o sangue muda em claridade E a nossa dor muda em saudade Branca assim da mesma cor

A versão:


by Tia Judith, lá por meados de 1984:

Não há coisa melhor do que cagar no urinol
Não há coisa melhor do que cagar no urinol

A gente senta na beirada do penico
Parecendo gente rico com vontade de defecar
Estufa o peito, estufa a veia do pescoço
Caga fino e caga grosso
Caga até o cu rachar


Agora acho que vocês podem imaginar como era a mais querida de todas as minhas tias-avós, não??? Hehehehe.